Nessa última semana, apesar do feriado, foi uma semana intensa de trabalho, onde tive contato com muitas pessoas diferentes de várias empresas e cidades, com as quais interagi em contextos distintos, em diversas formas de contato: cursos, monitorias, coaching, conversas casuais ou reuniões de trabalho. Apesar da diversidade de público envolvido, um ponto em comum nessas interações me chamou atenção: A dificuldade em se posicionar falando claramente sobre o que não lhe agrada, ou seja, a evitação de conversas difíceis.
Foram mais de dez pessoas que compartilharam comigo a dificuldade em se organizar para conversas que julgam ser muitíssimo importantes, mas que por considerarem difíceis, vão postergando continuamente, gerando angústia, ansiedade, temor, que vai se acumulando em um grande peso sob os ombros.
Deixar abertas questões que de fato poderiam ser resolvidas com uma conversa, alimenta um ciclo contínuo de desconforto que contribui para nos fecharmos cada vez mais, pois o temor vai crescendo com o passar do tempo, enquanto você imagina cenários cada vez piores de como a conversa vai se desenrolar.
O ponto crítico aqui, é que esse ciclo vai se auto alimentando e criando mais e mais situações críticas na relação, levando em último caso ao rompimento. Mas o que poderia parar esse ciclo?
Vamos pensar em uma situação real: Julio vem se sentindo bastante chateado pela forma rude com que seu gestor tem falado com ele, seja para passar tarefas, ou para acompanhar o status das mesmas. Ele vem se sentindo incomodado com essa postura e fica pensando no que ele pode ter feito para seu gestor trata-lo assim. Está bem chateado com tudo isso e ao invés de conversar com o gestor, para saber de fato o que ocorreu, fica alimentando hipóteses de causas, sem chegar a uma resposta. Em consequência, vem dormindo mal, o que tem gerado dor de cabeça continuamente e desatenção no dia a dia pela falta de sono e stress.
Essa sequencia de fatos, dá ao gestor uma percepção de que a produtividade de Julio esta decaindo e insatisfeito com seu trabalho trata-o ainda com mais rispidez. Isso gera mais desconforto, que ele não compartilha, sente-se mais pressionado, dorme mal e fica com sua saúde cada vez mais comprometida.
Bom, repito minha pergunta anterior, o que poderia romper esse ciclo?
A Resposta parece bem óbvia: “Falar”!
Compartilhar o que percebe na situação trazendo fatos e dados, falar como se sente, posicionar-se sobre o que pensa e sobre o que deseja como forma de tratamento para si mesmo, enfim… “Falar” ao invés de “Calar”!
dificuldade em se posicionar falando claramente sobre o que não lhe agrada, ou seja, a evitação de conversas difíceis
É claro que existem momentos onde é oportuno adiar um pouquinho a conversa. Ânimos exaltados, não ter privacidade suficiente no local, situação emocional dos envolvidos, enfim o contexto do momento pode não ser o mais favorável para uma conversa com qualidade. Nesses casos, é fundamental se organizar para que a conversa ocorra em outro momento, mas o mais breve possível, para que não se distancie dos exemplos e fatos objetivos.
Agora, por que adiamos tanto uma conversa difícil?
Na grande maioria dos casos, evitamos conversas difíceis pela falta de ‘Coragem Emocional’.
A palavra Coragem vem do Latim e de acordo com o Site de Etimologia Origem da Palavra, significa ‘agir com o coração’. Ter coragem é agir de acordo com o que sente e pensa verdadeiramente. Essa é a principal causa de evitarmos tais conversas, pois o foco de nossa ação ao pensarmos no momento da conversa, é no que o ‘outro’ vai sentir e pensar e não no que nós mesmos sentimos ou pensamos. Evitamos conversas difíceis pela preocupação de deixar o ‘outro’ constrangido e magoado ou por receio da resposta ou reação do ‘outro’. Ou seja, não agimos de acordo com o que sentimos e pensamos, focamos na fantasia do que o ‘outro’ vai sentir ou pensar e isso bloqueia a ação. Para Muriel James, autora de vários livros sobre Análise Transacional, “A coragem opera do ‘coração’ ou centro do que somos e dirige-nos para auto-realização.”
Nessa semana ouvi vários relatos de pessoas que conseguiram romper o ciclo do evitar conversas difíceis. Tomaram coragem e partiram para a ação, exercitando o ‘falar’ de forma organizada e planejada. Sabe qual foi a resposta quando questionei como tinha sido a experiência? “Foi muito mais tranquilo do que eu tinha imaginado!”. Todos os que experimentaram suas “conversas difíceis”, sem exceção, perceberam que suas fantasias e fantasmas eram muito maiores do que a realidade vivenciada.
Evitar uma conversa difícil é como um empréstimo, no qual, quanto mais tempo demoramos a pagar o principal (efetivar a conversa de fato), mais pagamos juros em forma de ansiedade, temor e angústia (Leia também Ocupar-se para não preocupar-se). Como uma bola de neve, vamos aumentando a dívida com o valor dos juros, até que fique insustentável. A diferença aqui é que podemos deixar de adiar e eliminar os juros. Quando falamos o que pensamos e sentimos de forma clara, tranquila e transparente, estamos investindo em nossa habilidade de comunicação, fortalecemos a coragem emocional e obtemos rendimentos em nossas relações interpessoais. O que você prefere? Dívidas ou investimentos?
É possível se tornar um bom investidor no campo das relações humanas. Coragem emocional é um ingrediente importante que pode ser desenvolvido com alguns questionamentos para o planejamento prévio da conversa.
- Qual resultado desejo? Provar que o outro está errado, ou demonstrar como você se sente? Comece a pensar sobre o resultado que almeja, e então responda de maneira a alcançar esse resultado.
- O que e como devo comunicar para obter o resultado desejado? Primeiramente, é fundamental expor os fatos e dados, de forma objetiva, trazendo a situação ocorrida e o que isso gerou em você. Se quiser ficar mais próximo de alguém, “Me senti magoado e agredido pela forma como falou comigo” é claramente uma opção melhor do que “Você foi agressivo e grosseiro comigo!”. O outro ficará muito mais receptivo quando você compartilha algo, do que quando você o acusa. Perceba o que é possível você reconhecer na situação. “Sei o quanto você se sente pressionado e compreendo que…”. E finalize questionando o que vocês podem combinar a partir de hoje, a fim de firmar um contrato de condutas diferentes entre vocês.
- Como posso aumentar suas chances de ser ouvido? Mais importante do que encontrar as palavras certas para argumentar, é se predispor a ouvir e compreender o outro, isso o convida a ser receptivo a ouvir também. Então seja curioso e faça perguntas, desfocando de seu julgamento e fantasias internas. Recapitule falando o que ouviu e antes de dar sua perspectiva do assunto, pergunte a outra pessoa se você entendeu a opinião dela. Se a resposta for negativa, pergunte o que não está conferindo. Se ele disser que sim, pergunte, “Posso dar minha opinião?”. Uma resposta afirmativa para essa última pergunta é sinal de concordância para ouvir. E como você acabou de dar um grande exemplo de bom ouvinte, a outra pessoa estará bem mais propensa a retornar o favor.
Esses passos irão lhe auxiliar no planejamento de ‘conversas difíceis’ e a prática, exercitando a conversa irá contribuir para o desenvolvimento de sua coragem emocional. (Leia também: Um Novo Olhar – Ampliando a Visão). Adiar uma conversa complicada só piora as coisas.
Aceite que você precisa ter aquela conversa, escolha, de modo premeditado, quando e onde ela irá ocorrer, mantenha-se confiante, conectado com ‘seu coração’, com o que de fato sente e pensa, e siga em frente. Acredite, você se sentirá muito melhor e mais leve quando tudo tiver acabado! Ótima conversa para você!
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